Seguidores

sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Trabalho envenenado


Viviane Tavares - Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz)

Uso de agrotóxicos afeta diretamente os trabalhadores rurais que sofrem com intoxicação e outras doenças mais graves.
O Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo. Embora trágico, isso já não é mais novidade. No entanto, recentes pesquisas latino-americanas mostram que, além da intoxicação via alimentos, os trabalhadores também tem sofrido com esse impacto.

 E essa realidade está longe de ser mudada. Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), na safra 2010/2011, o consumo foi de 936 mil toneladas de agrotóxicos, movimentando US$ 8,5 bilhões entre dez empresas que controlam 75% desse mercado no país.

No artigo "Uso de agrotóxicos no Brasil e problemas para a saúde pública", publicado na última edição dos Cadernos de Saúde Pública, as autoras Raquel Maria Rigotto, Dayse Paixão e Vasconcelos e Mayara Melo Rocha afirmam que entre 2007 e 2011, de acordo com os dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), houve um crescimento de 67,4% novos casos de acidentes de trabalho não fatais devido aos agrotóxicos. No mesmo período, as intoxicações aumentaram 126,8%. Entre as mulheres, o crescimento foi ainda maior, 178%.

Para as pesquisadoras, os agrotóxicos constituem hoje um importante problema de saúde pública, "tendo em vista a amplitude da população exposta nas fábricas de agrotóxicos e em seu entorno, na agricultura, no combate às endemias e outros setores, nas proximidades de áreas agrícolas, além de todos nós, consumidores dos alimentos contaminados", explicam no artigo.

Agrotóxicos no trabalho

O pesquisador da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Pedro Henrique de Abreu, em sua pesquisa "O agricultor familiar e o uso inseguro de agrotóxicos no município de Lavras, em Minas Gerais", afirma que "não existe viabilidade de cumprimento das inúmeras e complexas medidas de uso seguro de agrotóxicos no contexto socioeconômico destes trabalhadores rurais." Pedro visitou 81 unidades de produção familiar em 19 comunidades no município de Lavras (MG). Ele usou como referência os manuais de segurança da indústria química e do Estado e tentou verificar a viabilidade do cumprimento dessas normas na agricultura familiar.

Em sua pesquisa, Pedro utilizou manuais de segurança elaborados pela associação das indústrias químicas no Brasil e por instituições públicas de saúde, agricultura e trabalho. "Os resultados apontaram que a aquisição de agrotóxicos é feita sem perícia técnica para indicar a real necessidade de utilização desses produtos, que a receita agronômica é predominantemente fornecida por funcionários dos estabelecimentos comerciais e que os agricultores não recebem informações e instruções adequadas sobre medidas de segurança no momento da compra", explica a pesquisa.

 Além disso, segundo o texto, o transporte de agrotóxicos é realizado nos veículos disponíveis, como caminhonetes e caminhões, que são não adaptados aos requerimentos de segurança. A questão do armazenamento também é crítica, pois os agricultores utilizam as construções que dispõem para o estoque dos agrotóxicos, independente das condições estruturais e da proximidade das mesmas com residências ou fontes de água.

 Além disso, o tamanho das propriedades, em grande parcela próxima das residências dos agricultores, impossibilita que o preparo e a aplicação sejam realizados a uma distância que impeça que os agrotóxicos atinjam residências.

 A falta de informação e de assistência técnica no que diz respeito aos EPIs e outras medidas de segurança necessárias, como o descarte nessas atividades também carecem de atenção.

 "As dificuldades criadas pelos estabelecimentos comerciais, assim como os custos envolvidos na atividade são os principais motivos para a não devolução das embalagens vazias; e que, por carência de informação, a lavagem das vestimentas e EPIs contaminados por agrotóxicos é entendida como atividade doméstica comum, sendo, portanto, realizada sem a observação de medidas de segurança", explica o estudo, que completa: 

"Conclui-se que a tecnologia agroquímica não pode ser utilizada sob os conceitos de controle de riscos na estrutura geral das unidades produtivas de agricultura familiar. Não existindo, desta forma, viabilidade de cumprimento das inúmeras e complexas medidas de uso seguro de agrotóxicos no contexto socioeconômico destes trabalhadores rurais".

Consequências mais graves
Recentemente publicado em sites de movimentos contra o agrotóxicos, o Grupo de Genética e Mutagêneses Ambiental (GEMA), formado por pesquisadores da Universidade Nacional de Río Cuarto (UNRC), declarou depois de oito anos de pesquisa e quinze publicações científicas, entre elas a "La genotoxicidad del glifosato evaluada por el ensayo cometa y pruebas citogenéticas", na revista científica Toxicologia Ambiental e Farmacologia, da Holanda, que os agrotóxicos causam alterações genéticas e aumentam as probabilidades de contrair câncer, sofrer abortos espontâneos e nascimentos com malformações. 

Os estudos foram confirmados em pessoas e animais. Entre os venenos mais recorrentes estão o glifosato, endosulfam, atrazina, clorpirifos e cipermetrina. 

Em diversas pesquisas confirmamos alterações genéticas em pessoas expostas a agrotóxicos. A alteração cromossômica que vimos, indica quem tem mais risco de sofrer de câncer, a médio e longo prazo

Assim como outras doenças cardiovasculares, malformações, abortos", explicou Fernando Mañas, doutor em Ciências Biológicas e parte da equipe da UNRC, em entrevista para o Página/12, da Argentina.

domingo, 19 de outubro de 2014

O uso de pesticidas por agricultores, ligados a altas taxas de depressão, suicídios



Testes com animais demonstram alteração no funcionamento de células nervosas; estudos nos EUA, na China e no Brasil também sugerem aumento no risco de depressão em seres humanos
viso de toxicidade por uso de pesticidas: doenças mentais, depressão e suicídios de agricultores podem estar relacionados aos produtos químicos

Em sua fazenda no estado do Iowa, nos Estados Unidos, Matt Peters trabalhava do nascer ao pôr do sol plantando 1500 acres com sementes tratadas com pesticidas. "Sempre me preocupava com ele nas primaveras", diz a esposa Ginnie, "e me sentia aliviada quando ele terminava o trabalho". Em 2011, o marido "calmo, racional e carinhoso" se tornou subitamente deprimido e agitado. 

"Ele me disse: 'Eu me sinto paralisado'", conta. "Ele não conseguia dormir ou pensar. Do nada, ficou deprimido".

Matt, aos 55, tirou sua própria vida. Ninguém sabe o que engatilhou sua mudança súbita de humor e comportamento.

Matt Peters deixou para trás sua esposa, Ginnie, e dois filhos
Mas, desde a morte do marido, Ginnie se lançou em uma missão para não apenas conscientizar as pessoas sobre o suicídio em famílias de agricultores, como também para chamar atenção para as crescentes evidências de que os pesticidas podem alterar a saúde mental dos agricultores.

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Impacto de remédios na natureza faz peixes machos ficarem femininos

Características femininas em peixes machos foram notadas pela primeira vez nos anos 90
Características femininas em peixes machos foram notadas pela primeira vez nos anos 90



Nós, seres humanos, tomamos paracetamol para dor de cabeça, contraceptivos para evitar a gravidez e Prozac para a depressão.


Mas para onde vão os resíduos destas substâncias uma vez cumprida a sua função?


O corpo humano elimina muitos dos medicamentos que ingerimos através da urina. A urina vai para os esgotos e, depois de atravessar um sistema imperfeito de purificação, os resíduos desembocam nos rios que alimentam o planeta.


Embora as concentrações de drogas na água sejam baixas, as consequências destas para os ecossistemas não deixam de ser preocupantes: desde peixes machos que adquirem características femininas até aves selvagens que perdem a vontade de comer, além de populações inteiras de peixes e outros organismos aquáticos dizimadas.

Diversos estudos sobre o impacto da poluição farmacêutica sobre a vida selvagem apontam que o uso crescente de drogas projetadas para serem biologicamente ativas em baixas doses pode estar causando uma crise global da vida selvagem.

"As populações de muitas espécies que vivem em paisagens alteradas pelo homem estão encolhendo por razões que não podemos explicar completamente", disse a pesquisadora Kathryn Arnold, da Universidade de York, na Inglaterra.

"Acreditamos que é hora de explorar novas áreas, como a poluição farmacêutica."

Machos femininos

Para os seres humanos, no entanto, a presença de drogas em baixa concentração na água não é um problema: seria necessário tomar entre 10 milhões e 20 milhões de litros de água da torneira para ingerir medicação suficiente para, digamos, aliviar uma dor de cabeça.

No caso dos peixes, a história é outra.

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Após oito anos de pesquisas, relatório confirma vinculação glifosato/câncer



Oito anos de pesquisa, quinze publicações científicas e uma certeza: os agrotóxicos causam alterações genéticas e aumentam as probabilidades de contrair câncer, sofrer abortos espontâneos e nascimentos com malformações. A declaração vem do Grupo de Genética e Mutagêneses Ambiental (GEMA), pesquisadores da Universidade Nacional de Río Cuarto (UNRC), que confirmaram com estudos em pessoas e animais, as consequências sanitárias do modelo agropecuário. Glifosato, endosulfam, atrazina, clorpirifos e cipermetrina são alguns dos agrotóxicos prejudiciais. “A vinculação entre alteração genética e câncer é clara”, reafirmou Fernando Mañas, pesquisador da UNRC.

“La genotoxicidad del glifosato evaluada por el ensayo cometa y pruebas citogenéticas” é o título que leva a pesquisa publicada na revista científica Toxicologia Ambiental e Farmacologia (da Holanda). O trabalho descreve o efeito genotóxico (o efeito sobre o material genético) do glifosato sobre células humanas e ratos, que, inclusive, confirmaram alterações genéticas em células humanas com doses de glifosato em concentrações até vinte vezes inferiores às utilizadas nas pulverizações em campo.

Outra pesquisa se chama “Genotoxicidad del AMPA (metabolito ambiental del glifosato), evaluada por el ensayo cometa y pruebas citogenéticas”. Publicada na revista Ecotoxicologia e Segurança Ambiental (dos EUA). O AMPA é o principal produto da degradação do glifosato (o herbicida se transforma, principalmente, pela ação de enzimas bacterianas do solo, na AMPA). Confirmaram que o AMPA aumentou a alteração no DNA de em culturas celulares e em cromossomos em culturas de sangue humano. “O AMPA demonstrou ter tanta ou maior capacidade genotóxica que sua molécula parental, o glifosato”, afirma a pesquisa da universidade pública.