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quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Na Câmara, proposta tenta liberar sementes transgênicas ‘suicidas’


Na terceira matéria do especial #TransgênicosNoBrasil, a proposta que tramita na Câmara dos Deputados com o objetivo de permitir tecnologia 'terminator' para certos casos. Ambientalistas temem que aprovação signifique a liberação total

Objetivo é permitir tecnologia terminator para certos casos, mas ambientalistas temem que aprovação signifique a liberação total. Confira série sobre transgênicos

Rio de Janeiro – Marcado pelas manifestações que em diversos pontos do país aproveitaram a celebração do Dia Mundial da Alimentação para denunciar os impactos socioambientais provocados pela expansão dos transgênicos no Brasil, o mês de outubro viu também renascer com força na Câmara dos Deputados a batalha política em torno dos organismos geneticamente modificados.

Para preocupação do movimento socioambientalista, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) voltou a analisar uma proposta, de autoria do deputado Eduardo Sciarra (PSD-PR), que altera a Lei de Biossegurança para permitir a adoção de sementes elaboradas a partir de “tecnologias de restrição de uso”, popularmente conhecidas como sementes suicidas, ou terminator, que se tornam estéreis quando da colheita, obrigando os agricultores a adquirirem-nas novamente para uma nova safra. Em sentido contrário, o deputado Ivan Valente (Psol-SP) apresentou à Mesa Diretora da casa um projeto de lei que pretende banir definitivamente os alimentos transgênicos do território brasileiro.


Elaborado por Sciarra e chancelado há dois anos com o parecer favorável dado pelo relator, o deputado Dilceu Sperafico (PP-PR), o Projeto de Lei 268/2007, segundo o texto apresentado à CCJ, “proíbe a comercialização de sementes que contenham tecnologias genéticas de restrição de uso de variedade, salvo quando se tratar de sementes de plantas biorreatoras, ou seja, organismos geneticamente modificados para produzirem proteínas ou substâncias destinadas, principalmente, ao uso terapêutico ou industrial”. O objetivo, segundo os defensores do projeto, seria liberar o uso da tecnologia terminator exclusivamente nas biorreatoras, mas os ambientalistas e até mesmo setores do governo temem que sua aprovação, na prática, signifique uma liberação total das sementes suicidas. Se isso acontecer, o Brasil será o primeiro país a desrespeitar a moratória contra a tecnologia terminator, firmada desde 2000 no âmbito do Protocolo de Cartagena, da ONU, que trata da proteção à biodiversidade em todo o planeta.



“Embaraço”

O PL 268/2007 só não foi aprovado pela CCJ na sessão de 16 de outubro, exatamente o Dia Mundial da Alimentação, graças à pressão de alguns integrantes da comissão, como os deputados Alessandro Molon (PT-RJ) e Chico Alencar (Psol-RJ), que registraram voto em separado e acabaram provocando o adiamento da decisão. Por enquanto, a proposta elaborada por Sciarra – uma adaptação de um projeto inicialmente apresentado à Câmara pela hoje senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), ex-presidenta da Confederação Nacional de Agricultura (CNA) – ainda não voltou à pauta da CCJ. Mas sua aprovação e posterior encaminhamento à votação em plenário são muito prováveis, dada a grande presença na comissão de deputados que integram a Frente Parlamentar da Agricultura.

No governo, a posição da maioria é pela não aprovação do PL que libera a tecnologia terminator no país. No Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), mais alinhado aos interesses do agronegócio, existe uma discreta simpatia pela proposta de Sciarra, mas representantes dos ministérios do Meio Ambiente (MMA) e do Desenvolvimento Agrário (MDA) têm trabalhado junto a parlamentares da base governista para tentar barrar sua aprovação. Na última tentativa de votação na CCJ, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas, chegou a telefonar a parlamentares para lembrar que a aprovação do PL 268/2007 implicaria grande embaraço internacional para o Brasil.
Impedir a aprovação do PL 268/2007 é prioridade para as organizações que integram os movimentos de resistência aos transgênicos no país: “Esse PL, que visa à liberação das sementes terminator, é uma ameaça à segurança alimentar e à biodiversidade brasileiras. A eventual produção e comercialização dessas sementes transgênicas teria um impacto imenso no incremento da pobreza no campo, pois obrigaria os agricultores e agricultoras a comprarem novas sementes a cada safra”, diz Marcelo Montenegro, assessor de Campanhas da ActionAid Brasil, organização que lidera uma campanha pública contra a aprovação do PL 268/2007.

Modelo de desenvolvimento
Já o Projeto de Lei 6.432/2013, apresentado pelo deputado Ivan Valente, tem o objetivo de “proibir em todo o território brasileiro a venda de sementes, o cultivo de plantas alimentícias transgênicas com tolerância a herbicidas e a importação de produtos alimentícios in natura ou industrializados obtidos dessas plantas”. Apresentado à Mesa Diretora da Câmara, o PL foi encaminhado em 15 de outubro à Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural (CAPADR), onde aguarda para ser apreciado.

O texto do PL elaborado por Valente cita o caso da tecnologia transgênica RoundUp Ready, desenvolvida pela empresa transnacional de origem estadunidense Monsanto para criar plantas resistentes ao herbicida glifosato: “Um exemplo claro de risco à saúde do consumidor pode ser dado pelo uso do herbicida RoundUp. Em se tratando do plantio de soja convencional, o nível permitido de resíduo deste herbicida no grão da soja é de 0,2 ppm ou 2 mg/kg de grão. No caso da soja transgênica tolerante ao herbicida RoundUp, esse nível de resíduo permitido no grão sobe para um patamar muito elevado, de 10 ppm ou 10 mg/kg de grão. Ou seja, a soja tolerante a herbicida pode ter 50 vezes mais herbicida que a soja não tolerante a esse herbicida, que já foi indicado por estudos científicos como um produto nocivo à saúde humana, mesmo em doses mínimas”.

Marcelo Montenegro, da ActionAid, afirma que o PL 6.432/2013 deve servir para estimular o debate sobre que modelo de desenvolvimento o país quer: “Consideramos positivo que o governo fortaleça políticas e planos que deem mais independência e
à agricultura familiar e camponesa, que é responsável por mais de 70% dos alimentos que consumimos no Brasil. Iniciativas como o Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo), lançado recentemente, são exemplos de como aliar formas sustentáveis de produção, estimulando a transição dos modelos convencionais para aqueles sustentáveis”, diz.

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