Ao aproximar-se de movimentos sociais durante o Fórum Social Mundial Temático, que terminou ontem (29), a presidente Dilma Rousseff garantiu que o novo Código Florestal, em tramitação na Câmara, "não será o texto dos sonhos dos ruralistas".
Em reunião com 80 entidades da sociedade civil, na semana passada, a presidente sinalizou que vai barrar propostas que aumentem o desmatamento, caso sejam aprovadas pelo Congresso.
O aceno de Dilma foi bem recebido por ativistas. "Dilma disse claramente que o texto não será o código [florestal] dos sonhos dos ruralistas. Ela assumiu esse compromisso", comentou Mauri Cruz, um dos organizadores do fórum social. "Isso não significa que o código vai ser perfeito, mas sinaliza que ela não vai sancionar do jeito que está", disse Cruz. A promessa foi feita em reunião que contou com a presença do ministro da Agricultura, Mendes Ribeiro (PMDB). "Esse compromisso é muito importante para nós. [O ex-presidente Luiz Inácio] Lula [da Silva] tinha um vínculo natural com os movimentos sociais, mas ainda não tínhamos a mesma liberdade com a presidente. Dilma se aproximou. Temíamos que não acontecesse."
Para representantes dos movimentos sociais, no entanto, o gesto da presidente não foi só uma forma de aproximação, mas também de pedir apoio à Rio +20 que, a exemplo do Fórum Social Mundial Temático, deve ser esvaziada. A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, nome oficial da Rio +20, vai acontecer em junho no Rio de Janeiro.
Na reunião com Dilma, ativistas disseram que o Brasil não pode sediar a Rio +20 com uma legislação ambiental "retrógrada". "O Brasil tem o dever de se apresentar bem e levar uma proposta concreta", disse Oded Grajew, um dos idealizadores do Fórum Social Mundial.
O clima de pessimismo sobre o futuro da Rio +20 e de possível fracasso da conferência dominou o fórum social, que foi um encontro preparatório dos movimentos sociais para o evento da ONU no Rio de Janeiro. Como o fórum social foi esvaziado, ativistas temem que o mesmo aconteça tanto na Rio +20 quanto na Cúpula dos Povos, evento que a sociedade civil organiza para acontecer durante a conferência das Nações Unidas.
Chamada de temática, esta edição do Fórum Social Mundial, em Porto Alegre , reuniu cerca de 30 mil pessoas, segundo Mauri Cruz, um dos organizadores do evento. Em outras edições, o fórum teve mais de 150 mil participantes. As atividades foram pulverizadas na capital e em cidades da região metropolitana, dificultando o deslocamento e a participação nos eventos. Problemas na organização e na divulgação dos debates também fizeram com que muitos eventos fossem esvaziados.
Para Maria Cecília Wey, secretária geral da WWF, o formato do fórum social "não tem favorecido" que os debates se transformem em idéias concretas. "Está tudo muito disperso", comentou. Do debate que a representante da WWF participou com Marina Silva, João Pedro Stédile, do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), e integrantes da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), SOS Mata Atlântica e Greenpeace, nenhuma proposta foi registrada para ser levada à Rio +20, por exemplo. "Não sei como vão transformar essas ideias em ação. Acaba sendo mais uma troca de informações do que outra coisa", comentou.
Maria Cecília demonstrou receio em relação à Cúpula dos Povos, evento que será organizado pela sociedade civil durante a Rio +20. "Serão pelo menos três espaços diferentes para os movimentos sociais se reunirem. Com essa dispersão, não sei como vamos conseguir influenciar a conferência", analisou.
Um dos idealizadores do Fórum Social Mundial, Chico Whitaker, defendeu uma "mudança de estratégia" para as próximas edições do encontro de movimentos sociais. "Corremos o risco de a esquerda falar só para si mesma. O fórum precisa ir para a sociedade. Precisamos parar de falar para nós mesmos", afirmou.
A expectativa de que a Rio +20 seja um fiasco ganhou mais força durante os debates sobre a crise do capitalismo. Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do Dieese e responsável por organizar propostas do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social para a Rio +20, analisou que a crise econômica enfrentada por países desenvolvidos impedirá o debate ambiental. "O problema imediato é a crise econômica e não a ambiental", disse Clemente. "O enfrentamento da crise exige a retomada da atividade econômica, cuja referência é produzir do jeito que fizemos até hoje. A crise exige uma solução que agrava o problema ambiental", afirmou.
Clemente lembrou que até mesmo o Brasil, que sediará a Rio +20, incentivou a produção e venda de automóveis no enfrentamento da crise econômica de 2008. "Saímos bem economicamente, o que não significa que ambientalmente tivemos sucesso. Agravamos a emissão de gases de efeito estufa com a venda de automóveis", comentou. "A Rio +20 pode fracassar do ponto de vista político, com a ausência de um compromisso político vigoroso em relação a uma agenda de mudança no padrão de produção."
Fonte: Jornal da Ciência
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