Oito de cada dez metros das Áreas de Preservação
Permanentes já desmatadas às margens de rios e encostas de morros no País
viraram pasto, mostra um retrato recente da ocupação das chamadas APPs, a parte
mais estratégica e polêmica da reforma do Código Florestal, em debate no
Congresso. Reportagem de Marta Salomon, em O Estado de S.Paulo.
A
recuperação das APPs é o maior nó na reta final da negociação da reforma das
regras de proteção do ambiente nas propriedades privadas. A tendência das
negociações é reduzir ainda mais a exigência de recuperação de áreas ocupadas
pelo agronegócio, em nova versão da reforma a ser apresentada amanhã.
Estudo
do professor da USP Gerd Sparoveck estima que 550 mil km2 nas APPs às margens
de rios e encostas de morros foram desmatadas, de um total de 1,3 milhão de km2
de proteção da vegetação natural exigida pelo Código em vigor. Das áreas já
desmatadas, 440 mil km2 são ocupados por pastagens, calcula o estudo. A
extensão dos pastos em APPs corresponde a mais de 1,5 vez o território do
Estado de São Paulo.
“No
melhor dos mundos, haverá a restauração da vegetação natural de 15% das Áreas
de Preservação Permanentes desmatadas, não mais do que isso. Na pior dos
mundos, nem isso será recuperado”, calcula Sparoveck, cujas estimativas sobre
desmatamento das áreas de proteção vêm subsidiando os debates do Código
Florestal desde o início dos trabalhos do então relator na Câmara, deputado
Aldo Rebelo (PC do B-SP), hoje ministro do Esporte. Os números são usados como
referência tanto por ruralistas como por ambientalistas.
Sparoveck
sugere um programa de custo reduzido para recuperação das APPs, baseado em
investimentos em cercas e bebedouros, sem prejuízo ao tamanho do rebanho, mas
que exigiriam maior produtividade da pecuária brasileira.
O
estudo indica um porcentual menor de cultivo de grãos e alimentos que poderia
ser atingido pela exigência de recuperação das APPs, entre 5% e 32%, nos biomas
Amazônia, Cerrado e Mata Atlântica. No Cerrado, 20% das APPs desmatadas são
ocupadas pela agricultura.
Acordo.
As negociações em curso, no entanto, vão em outra direção. Amanhã, o relator na
Comissão de Meio Ambiente, senador Jorge Viana (PT-AC), apresenta uma nova
tentativa de acordo, negociado com o relator nas Comissões de Ciência e
Tecnologia e Agricultura, senador Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC).
Uma
nova leva de concessões ao agronegócio tentará conter a oposição manifestada
por líderes ruralistas. Proposta negociada com o governo prevê que
proprietários de imóveis de 4 a
15 módulos rurais (de 20 a
1.500 hectares ,
dependendo do município) também possam escapar da exigência de recuperar APPs,
dependendo do aval dos conselhos estaduais de meio ambiente.
A
justificativa é beneficiar proprietários rurais que têm seus imóveis
localizados quase integralmente nas áreas de proteção às margens de rios mais
largos, como o Iguaçu e o São Francisco. O Estado apurou que a ideia é obrigar
que proprietários de terras enquadrados nessa situação recuperem pelo menos 20%
da vegetação natural em seus imóveis, desde que não estejam localizados no
bioma Amazônia. Os benefícios eram previstos inicialmente apenas para pequenos
agricultores.
A
nova versão de acordo para a votação da reforma do Código trará regras de
recuperação das matas ciliares adaptadas à largura dos rios. Até aqui, o texto
exigia a recuperação de pelo menos 15 metros às margens dos rios mais estreitos,
com até 10 metros
de largura. A redação, aprovada pela Câmara, foi questionada no Senado. O
governo endossa novas concessões desde que elas se restrinjam a imóveis
produtivos e única residência dos proprietários.
A
negociação no Congresso também prevê novas concessões para a produção de
camarão e de sal em
manguezais. Pressionado por setores de seu partido, o senador
Luiz Henrique proporá a liberação das atividades instaladas em manguezais até
2010. O governo, por ora, é contra essa nova mudança de última hora.
As
negociações avançariam pelo fim de semana, na busca de um texto que reúna o os
votos de deputados e senadores e garantam a sanção do futuro código florestal
por Dilma Rousseff.
http://www.ecodebate.com.br/2011/11/21/vegetacao-natural-virou-pasto-em-80-das-areas-de-preservacao-permanente-apps/
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