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sexta-feira, 2 de março de 2012

Cientistas voltam a alertar sobre consequências do novo Código Florestal


CARTA ABERTA DA SOCIEDADE BRASILEIRA PARA O PROGRESSO DA  CIÊNCIA (SBPC) E DA ACADEMIA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS (ABC)



A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia Brasileira de Ciências  (ABC) vêm alertar para  algumas das consequências que poderão resultar do projeto  de lei que altera  o Código Florestal (CF), na versão que será proximamente votada na Câmara dos Deputados.

A SBPC e a ABC reconhecem os avanços contidos no  texto do CF na versão apresentada pelo Senado Federal, em particular o estabelecimento  do Cadastro  Ambiental  Rural (CAR)  e dos  mecanismos de  apoio e incentivo à conservação e recuperação do meio ambiente, o condicionamento do crédito agrícola à regularização ambiental, o aumento da proteção ambiental em área urbana, a inclusão dos mangues entre as áreas de preservação permanente, a obrigação de projetos de lei específicos para cada bioma em um prazo de  três anos, as novas especificações e instrumentos legais que regulam o uso de fogo e o controle de incêndios e a distinção entre disposições permanentes e transitórias no CF.

Permanecem, no entanto, graves problemas.  Para que não se alegue o aval da ciência ao texto ora em fase final de deliberação no legislativo, as associações mais representativas da comunidade científica – a SBPC e a ABC - vêm novamente se manifestar e reiterar suas posições, cujas justificativas científicas já foram apresentadas ao longo de 2011, em  um livro e dois documentos, acessíveis no site da SBPC (www.codigoflorestal.sbpcnet.org.br).

Todas as áreas de preservação permanente (APP) nas margens de cursos d’água e nascentes devem ser preservadas e, quando degradadas, devem ter sua vegetação integralmente restaurada. A área das APPs, que deve ser obrigatoriamente recuperada,  foi reduzida em 50% no texto atual.

As APPs de margens de cursos d’água devem continuar a ser demarcadas, como foram até hoje, a partir do nível mais alto da cheia do rio. A substituição do leito maior do rio pelo leito regular para a definição das APPs torna vulneráveis amplas áreas úmidas em todo o país, particularmente, na Amazônia e no Pantanal.

Essas áreas são importantes  provedoras de serviços ecossistêmicos,  principalmente, a proteção de nossos  recursos hídricos e por isso, objeto de tratados internacionais de que o Brasil é signatário, como a Convenção de Ramsar (Convenção sobre Zonas Úmidas de Importância Internacional).

Reafirmamos que os usos  agrícolas praticados pelas comunidades tradicionais e  por ribeirinhos devem ter tratamento diferenciado. Em particular, as áreas de pousio devem continuar , sendo reconhecidas apenas à pequena propriedade ou posse rural familiar ou de população tradicional, como foram até o presente.

As  comunidades biológicas, as estruturas e as  funções ecossistêmicas das APPs e das reservas legais são distintas. Não faz sentido incluir APPs no cômputo das Reservas Legais (RLs) como proposto no artigo 16 do Projeto de Lei .A SBPC e a ABC sempre defenderam que a eventual compensação de déficit de RL fosse feita nas áreas mais próximas possíveis da propriedade, dentro do mesmo ecossistema, de  preferência na mesma microbacia ou bacia  hidrográfica. No entanto o projeto em  tramitação torna mais ampla a possibilidade de compensação de RL no âmbito do mesmo bioma, o  que não assegura  a equivalência ecológica de composição,  de  estrutura e  de função. Mantido esse dispositivo, sua regulamentação deveria exigir tal equivalência e estipular uma distância máxima da área a ser compensada, para que se mantenham os serviços ecossistêmicos regionais.

A principal motivação que justifica a RL  é o uso sustentável dos recursos naturais nas áreas de menor aptidão agrícola, o que possibilita conservação da biodiversidade nativa com aproveitamento econômico, além da diversificação da produção. Por isso,  na recuperação das RLs  degradadas, o  possível  uso temporário inicial de espécies exóticas não pode se transformar em uso definitivo, como fica assegurado pelo texto atual.          

A figura de áreas rurais consolidadas em APPs até a data de 22 de Julho de 2008, e a possibilidade dada no projeto  de serem mantidas e regularizadas não se justificam.

Desde pelo menos 2001, o desmate dessas áreas para uso alternativo do solo já estava explicitamente proibido. Essas áreas devem ser integralmente restauradas com vegetação nativa para que possam fornecer seus serviços ambientais.

Um dos pré-requisitos para o sucesso da restauração da mata ciliar é o isolamento do fator de degradação. Desse modo,  recuperar  a faixa marginal concomitantemente  com a utilização do espaço pelo gado, como fica permitido pelo artigo 62, parágrafo  4º, 5º, 7º e 8º impede os processos de recrutamento de mudas e regeneração da vegetação.


Finalmente, como em várias outras leis, as múltiplas exceções podem desvirtuar a regra.

Alguns exemplos são particularmente notáveis.  Embora os mangues estejam protegidos no texto do Senado, a permissão de exploração de 35% dos mangues fora da Amazônia (além dos que já estariam em áreas ditas “consolidadas”) e 10% na Amazônia  são preocupantes pois os mangues, entre outros serviços importantíssimos, são essenciais na reprodução de várias espécies de peixes de uso comercial.

Outra exceção à proteção dos mangues se refere  aqueles  cuja função ecológica  estiver comprometida. Nesse caso (art.8º, parágrafo 2º), autorizam-se obras habitacionais e de urbanização, inseridas em projetos de regularização fundiária de interesse social, em áreas urbanas consolidadas ocupadas por população de baixa renda.  Se a função ecológica do manguezal estiver comprometida, ela deve ser recuperada, uma vez que grande parte dos manguezais contaminados tem elevados índices de metais pesados e petróleo.

Manter populações de baixa renda nesses locais seria imoral.

Outras exceções dizem respeito à obrigação de restaurar. O tratamento diferenciado de poder restaurar extensão menor de APPs deveria ser restrito à agricultura familiar.

Fonte:http://www.sbpcnet.org.br/site/arquivos/carta_aberta.pdf
Site:http://www.sbpcnet.org.br/site/codigoflorestal/

Para saber mais:

Embrapa e SBPC criticam viés ideológico no Código Florestal


Nota da SBPC: Para que o novo Código Florestal não resulte em desastre


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