CARTA ABERTA DA SOCIEDADE BRASILEIRA PARA O PROGRESSO DA CIÊNCIA (SBPC) E DA ACADEMIA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS (ABC)
A Sociedade Brasileira para o
Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia Brasileira de Ciências (ABC) vêm alertar para algumas das consequências que poderão
resultar do projeto de lei que altera o Código Florestal (CF), na versão que será
proximamente votada na Câmara dos Deputados.
A SBPC e a ABC reconhecem os
avanços contidos no texto do CF na
versão apresentada pelo Senado Federal, em particular o estabelecimento do Cadastro
Ambiental Rural (CAR) e dos
mecanismos de apoio e incentivo à
conservação e recuperação do meio ambiente, o condicionamento do crédito
agrícola à regularização ambiental, o aumento da proteção ambiental em área
urbana, a inclusão dos mangues entre as áreas de preservação permanente, a
obrigação de projetos de lei específicos para cada bioma em um prazo de três anos, as novas especificações e
instrumentos legais que regulam o uso de fogo e o controle de incêndios e a
distinção entre disposições permanentes e transitórias no CF.
Permanecem, no entanto, graves
problemas. Para que não se alegue o aval
da ciência ao texto ora em fase final de
deliberação no legislativo, as associações mais representativas da comunidade científica – a SBPC
e a ABC - vêm novamente se manifestar e reiterar suas posições, cujas
justificativas científicas já foram apresentadas ao longo de 2011, em um livro e dois documentos, acessíveis no site
da SBPC (www.codigoflorestal.sbpcnet.org.br).
Todas as áreas de preservação
permanente (APP) nas margens de cursos d’água e nascentes devem ser preservadas
e, quando degradadas, devem ter sua vegetação integralmente restaurada. A área
das APPs, que deve ser obrigatoriamente recuperada, foi reduzida em 50% no texto atual.
As APPs de margens de cursos
d’água devem continuar a ser demarcadas, como foram até hoje, a partir do nível mais
alto da cheia do rio. A substituição do leito maior do rio pelo leito regular para a
definição das APPs torna vulneráveis amplas áreas úmidas em todo o país, particularmente, na
Amazônia e no Pantanal.
Essas áreas são importantes provedoras de serviços ecossistêmicos, principalmente, a proteção de nossos recursos hídricos e por isso, objeto de
tratados internacionais de que o Brasil é signatário, como a Convenção de
Ramsar (Convenção sobre Zonas Úmidas de Importância Internacional).
Reafirmamos que os usos agrícolas praticados pelas comunidades
tradicionais e por ribeirinhos devem ter tratamento
diferenciado. Em particular, as áreas de pousio devem continuar , sendo reconhecidas
apenas à pequena propriedade ou posse rural familiar ou de população tradicional, como
foram até o presente.
As comunidades biológicas, as estruturas e
as funções ecossistêmicas das APPs e das reservas legais são distintas.
Não faz sentido incluir APPs no cômputo das Reservas Legais (RLs) como proposto
no artigo 16 do Projeto de Lei .A SBPC e a ABC sempre defenderam que a eventual
compensação de déficit de RL fosse feita nas áreas mais próximas possíveis da
propriedade, dentro do mesmo ecossistema, de preferência na mesma microbacia ou bacia hidrográfica. No entanto o projeto em tramitação torna mais ampla a possibilidade de
compensação de RL no âmbito do mesmo bioma, o
que não assegura a equivalência
ecológica de composição, de estrutura e
de função. Mantido esse dispositivo, sua regulamentação deveria exigir
tal equivalência e estipular uma distância máxima da área a ser compensada,
para que se mantenham os serviços ecossistêmicos regionais.
A principal motivação que
justifica a RL é o uso sustentável dos
recursos naturais nas áreas de menor aptidão agrícola,
o que possibilita conservação da biodiversidade nativa com aproveitamento econômico,
além da diversificação da produção. Por isso,
na recuperação das RLs
degradadas, o possível uso temporário inicial de espécies exóticas
não pode se transformar em uso definitivo, como fica assegurado pelo texto atual.
A figura de áreas rurais
consolidadas em APPs até a data de 22 de Julho de 2008, e a possibilidade dada
no projeto de serem mantidas e
regularizadas não se justificam.
Desde pelo menos 2001, o desmate
dessas áreas para uso alternativo do solo já estava explicitamente proibido.
Essas áreas devem ser integralmente restauradas com vegetação nativa para que
possam fornecer seus serviços ambientais.
Um dos pré-requisitos para o
sucesso da restauração da mata ciliar é o isolamento do fator de degradação.
Desse modo, recuperar a faixa marginal concomitantemente com a utilização do espaço pelo gado, como
fica permitido pelo artigo 62, parágrafo 4º, 5º, 7º e 8º impede os processos de
recrutamento de mudas e regeneração da vegetação.
Finalmente, como em várias outras
leis, as múltiplas exceções podem desvirtuar a regra.
Alguns exemplos são
particularmente notáveis. Embora os
mangues estejam protegidos no texto do Senado, a permissão de exploração de 35%
dos mangues fora da Amazônia (além dos que já estariam em áreas ditas
“consolidadas”) e 10% na Amazônia são
preocupantes pois os mangues, entre outros serviços importantíssimos, são
essenciais na reprodução de várias espécies de peixes de uso comercial.
Outra exceção à proteção dos
mangues se refere aqueles cuja função ecológica estiver comprometida. Nesse caso (art.8º,
parágrafo 2º), autorizam-se obras habitacionais e de urbanização, inseridas em
projetos de regularização fundiária de interesse social, em áreas urbanas consolidadas
ocupadas por população de baixa renda.
Se a função ecológica do manguezal estiver comprometida, ela deve ser
recuperada, uma vez que grande parte dos manguezais contaminados tem elevados
índices de metais pesados e petróleo.
Manter populações de baixa renda
nesses locais seria imoral.
Outras exceções dizem respeito à
obrigação de restaurar. O tratamento diferenciado de poder restaurar extensão menor de
APPs deveria ser restrito à agricultura familiar.
Fonte:http://www.sbpcnet.org.br/site/arquivos/carta_aberta.pdf
Site:http://www.sbpcnet.org.br/site/codigoflorestal/
Fonte:http://www.sbpcnet.org.br/site/arquivos/carta_aberta.pdf
Site:http://www.sbpcnet.org.br/site/codigoflorestal/
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